Dança dos Orixás
Por Karla Mourão
As entidades da mitologia africana são retratadas no ensaio de Geraldo Melo em movimento errático como pedem as incertezas que cercam os deuses apaixonados do Candomblé*. Não há virtude ou vício, não há julgamento, há apenas o gesto que faz jus ao sentimento. A dança nas imagens dos orixás de Geraldo não contempla apenas o movimento do rito, mas alcança o estado de êxtase dos consagrados. Somos todos consagrados ao admirar a beleza das cores coreografadas pelas mãos do fotógrafo no domínio técnico da luz, a mesma luz que risca o céu de Iansã e a lâmina da Ogum. Nestas fotos em dinâmica rotação, experimentamos a tontura, a alegria e a tensão das festas africanas e brasileiras dedicadas à iniciação.
No entanto, a intenção de Geraldo, embora nascido em Salvador e fortemente influenciado pela presença do candomblé na cultura baiana, não é contar uma história de fé e devoção. É apenas contribuir para uma leitura laica da extrema riqueza poética dos mitos africanos: sua força estética, seu valor catártico, sua permanência no inconsciente coletivo das nações que compartilham a afro descendência e sua influência em todas as vertentes de expressão cultural destes povos.
O ensaio de Geraldo, portanto, é livre da leitura religiosa e, por isso mesmo, rico em novas leituras possíveis desses deuses que – assim como os deuses gregos com quem estamos mais familiarizados – se mantém alertas em defesa de tudo que é autêntico, visceral, mágico e imprevisível, assim como a arte.
*Religião de matriz africana com mais de três milhões de seguidores em todo mundo, principalmente na África e no Brasil.